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Livros espetaculares (mesmo!) para As Fábulas de La Fontaine

Sara Amado
Fotografia de cena

Fábula vem do latim (fabulare), como tantas outras palavras que estão na origem da nossa língua. Fabulare dá mesmo origem ao verbo falar. Diz-se que uma história, para ser uma fábula, deve ter animais com características humanas como protagonistas e uma moral no fim. Depois há exceções a esta regra — ou não fosse uma regra — e é permitido que os protagonistas não sejam sempre animais. Mas a lição está sempre lá.
É fácil encontrar um provérbio (também uma lição) que sirva de legenda a cada uma das fábulas. Nesta curadoria, escolhi nove fábulas de hoje que viessem falar com as nove de ontem que fazem este espetáculo — e nove provérbios!
Enquanto, nas fábulas antigas, acontece sempre qualquer coisa de mau a um dos protagonistas como consequência das suas opções ou ações, na maior parte das fábulas contemporâneas, acontece qualquer coisa de bom. As fábulas antigas são muito sintéticas enquanto as contemporâneas desenvolvem mais a narrativa. Talvez por isso possam ser mais positivas, pois permitem que haja tempo para que a personagem se redima e a história acabe bem. Nas fábulas, o timing é tudo: o sítio certo à hora certa, o momento perfeito e o sentido de oportunidade estão presentes em todas estas histórias.
O tempo em que os animais falavam é o tempo da infância, o tempo de todas as possibilidades, o tempo em que até os animais podem falar e dizer coisas importantes. La Fontaine (que resgatou as fábulas do esquecimento) dizia: “A fábula é como uma pintura na qual vemos o nosso retrato”. Alguém encontra aqui a sua fotografia?

 

«Tudo tem seu peso, conta e medida»
O livro O incrível rapaz que comia livros para a fábula «Uma doninha na dispensa»

Esta é a história de Henrique, um rapaz que adorava livros — mas não como eu e tu: o Henrique adorava comer livros. A princípio, até parece que as coisas lhe correm bem, como à doninha que conseguiu matar a fome. Mas os livros são para ler, não para comer, e depois de um grande exagero que o deixou ficar mesmo mal (como a doninha que acabou por ficar presa…), o Henrique percebeu que gostava era de ler e que isso é que era — é! — mesmo bom.

 

«Cada cabeça, sua sentença»
O livro O velho, o rapaz e o burro para a fábula «O urso que não era»

Este urso escolheu o sítio errado à hora errada: a gruta onde hibernou ficou mesmo por baixo de uma fábrica construída durante o inverno, enquanto ele dormia. Quando acordou, quem conseguia convencer os Homens de que ele não era um «homem tonto que precisa de fazer a barba e usa um casaco de peles?». Na fábula «O velho, o rapaz e o burro», percebemos que não adianta querer agradar a todos e mais vale pensar pela nossa própria cabeça. Senão corremos o risco de, como o urso, já nem sabermos quem somos nem o que queremos realmente.

 

«A vaidade é faladora; o orgulho, silencioso»
O livro Um capuchinho vermelho para a fábula «O corvo e a raposa»

Às vezes é melhor calar do que falar. Que o digam o corvo (que ficou sem o queijo) e o lobo (que foi desta para melhor) porque não souberam fechar a boca. Quer a raposa, quer esta menina de capuchinho vermelho usaram a cabeça e a vaidade dos outros para levar a melhor!

 

«A corda rebenta sempre do lado mais fraco»/«A união faz a força»
O livro Nadadorzinho para a fábula «O leão e o mosquito»

Na fábula «O leão e do mosquito», temos um animal minúsculo a vencer o rei da selva, só que afinal não. Fanfarrão, este mosquito, não acham? O Nadadorzinho apanhou o susto da vida dele com o peixe grande, mas teve a coragem de ser líder e de explicar aos outros pequenos como ele que a união faz a força e que a felicidade está ali mesmo ao virar da esquina, se nos atrevermos a ir procurá-la.

 

«Podemos violar as leis humanas, mas não as da natureza»
O livro O Sr. Tigre torna-se selvagem para a fábula «O lobo e o cordeiro»

Na conversa entre o lobo e o cordeiro, vamos percebendo que nada do que o cordeiro possa dizer, por mais lógico que seja, irá fazer com que o lobo não coma o cordeiro. Um dia, o Tigre desta história, senhor respeitável, resolveu quebrar as convenções, ser rebelde, selvagem! Mas ser rebelde e selvagem não é ser o que ele realmente é? Não andaria ele enganado todo o tempo?

 

«Com tempo e perseverança, tudo se alcança»
O livro Os figos são para quem passa para a fábula «A lebre e a tartaruga»

Por vezes, o momento certo é tudo o que precisamos para conseguirmos o que queremos. Era o que achava este urso que esperou pacientemente (e a certa altura desesperadamente) pelo momento perfeito para comer o figo. As coisas não correram como ele tinha previsto, tal como não era suposto a tartaruga ganhar à lebre. É que, para além do momento certo, é preciso lutar por aquilo que queremos — e, entretanto, percebermos o que é mesmo importante.

 

«A grande pressa, grande vagar»
O livro A árvore generosa para a fábula «A cigarra e a formiga»

Um menino tem uma árvore como amiga durante toda a vida. O menino tem pressa; a árvore tem tempo. O menino pede; a árvore dá. Embora passe pela vida apressado, o menino apercebe-se a tempo do verdadeiro valor da árvore e, no final, estão bem os dois. Na fábula da cigarra e da formiga — que é sempre contada para mostrar a importância do trabalho e de sermos precavidos (e, claro que sim, são coisas importantes) —, zango-me sempre com a formiga, tão pouco generosa e tão apressada com o seu trabalho. Não saberá ela cantar? Não saberá ela que dar é tão bom quanto receber?

 

«Não faças aos outros aquilo que não queres que te façam a ti»
O livro Estranhas Criaturas para a fábula «A cegonha e a raposa»

E se os animais nos fizessem o que nós lhes fazemos? Não é tudo a mesma coisa, pois não? Mas, às vezes, percebemos melhor o que sentem os outros se nos pusermos — ou nos puserem! — no lugar deles. Nesta história, começa e acaba tudo em festa. Porque a vida é mesmo uma festa, se a soubermos partilhar.

 

«Quem desdenha quer comprar»
O livro Achámos um chapéu para a fábula «A raposa e as uvas»

Uma destas tartarugas está com um dilema: o chapéu ou a verdade? Na história da raposa e das uvas, acreditas mesmo que a raposa acha que os frutos estão verdes? Não se virou ela quando caiu o cacho? Pois é, esta tartaruga não desdenhou, ela gostou mesmo muito do chapéu tal como a sua amiga, só que também foi pouco verdadeira. Mas no final lá acabou por preferir a verdade e a amizade (que são bem mais bonitas que qualquer chapéu).

 

Fotografia: LU.CA/Alípio Padilha